sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Um bolinho de chuva vindo de um pedaço de céu.

Celeste é minha professora de Yoga.Já passou dos oitenta e dá aula em três clubes diferentes.Pioneira da Yoga no Brasil,trbalha duro há muitos anos. Segue para o oficio de ônibus com duas bolsas entrecruzadas para não fazer mal a coluna.
Uma mulher rara, corajosa e forte. É uma professora paciente tanto com idosos já enferrujados no alongamento, quanto com adolescentes exibidos e apressados em mostrar serviço.
Cabelo impecável, olhos puxados e divertidas meias anti derrapantes.Já tomou alguns tombos na vida.Alguns lhe levaram para mesa de cirurgia, outros até hoje ainda não cicatrizaram.
Celeste perdeu dois filhos, uma irmã recentemente. Certo dia me contou de como seu marido lhe comunicou que ia embora: Ela prendia os cabelos longos e ele lhe disse `vou te deixar´.Ela,com aquela postura impecável olhou-o pela última vez e seguiu sozinha na criação dos meninos. Disse-me que um casal, para estar junto tem de comer um saco de sal e de açúcar, tolerar o bom e o ruim.
Um outro dia contou-me da resignação frente a perda de seu filho atropelado. E das noites que vieram com o outro filho no hospital. Noites de medo angústia e solidão. Enfrentadas com a sabedoria de que o sacrifício é parte da vida.
Enquanto a ouvia não pude me conter e comecei a chorar. O meu choro era de admiração, pela beleza das palavras que saiam daquela boca tão cheia de vivências e histórias para contar.
Na véspera de meu casamento fui até ela, lhe dar um beijo antes do dia d. Ela havia levado um forninho pesado, para minha nova cozinha. Mais uma vez me vi chorando na frente dela.Como podia alguém tão delicado a ponto de com mais de oitenta anos levar no ônibus algo tão pesado. Depois me dei conta que ela carrega coisas tão mais pesadas na vida com o mesmo sorriso sereno. Isso é a Celeste.
No fim de cada aula ela cuidadosamente embrulha um bolinho de chuva e deixa ao meu lado na esteira . Chega devagrazinho, sorrateiramente - como quem vai contar um segredo açucarado.É um carinho silencioso para não causar inveja nos outros alunos. Mas é para mim, e as vezes até me pergunto se mereço tamanha ternura no meio do meu dia tão corrido e atropelado.
Mas logo penso, novamente, isso é Celeste. E para cada aluno ela reserva uma surpresa cheia de afeto , uma palavra que vira mantra - tamanho ensinamento. Um olhar que reconhece em cada um dali, a necessidade de um afago. Coisa que ela sabe fazer melhor que ninguém.

2 comentários:

  1. adorei a homenagem, Lê. A Celeste é mesmo uma pessoa incrível. O bolinho de chuva especial pra vc é uma dádiva, e só é assim pq vc sabe reconhecer o valor que esse gesto tem.

    beijo

    e namastê

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