Rumo
a Ítaca.
.... Mas não apresse a viagem nunca.
Melhor muitos anos levares de jornada
E fundeares na Ilha velho enfim.
Rico de quanto ganhaste no caminho
Sem esperar riquezas que Ítaca te desse.
Uma bela Viagem deu-te Ítaca.
Sem ela não te ponhas a caminho.
Mais do que isso não lhe cumpre dar-te .
Ítaca não te iludiu, se a achas pobre.
Tu te tornaste sábio , um homem de
experiência .
E agora, sabes o que significam Ítacas.
(Konstantino Kabvafis)
Sempre adorei as festas de
reveillón. Todos de branco, se abraçando, desejando que o próximo ano seja
repleto de coisas boas. Ano novo, vida nova, possibilidade de recomeço. Bem
vestidos, de roupa nova branca,
contemplamos o que está por vir, celebrando. Recebemos o novo ano como quem
conhece um novo amor, acendemos velas, brindamos à ele, oferecemos flores ,cheios
de esperança que dessa vez vai ser melhor.
Existe algo de encantado no
futuro. Algo mais iluminado do que o
agora. Sempre há uma certa idealização do momento no qual não estamos vivendo.
O futuro obscuro vem com um
dever : Lá, naquele lugar serei feliz. Quando me casar, quando concluir um
projeto, quando tiver filho, quando comprar um apartamento. E se não acontecer? E se for diferente?
Tanto o passado quanto o
futuro ficam reservados numa espécie de altar em nossa mente. O passado por ter
sido meu, acaba tendo um valor nostálgico. Meu pai dizia : Não brinque com o
passado, ele é muito perigoso- ás vezes ele é muito sedutor. É muito fácil
virar refém do lugar onde não fui feliz, ficando numa condição de vítima
privilegiada , paralisada ,revendo que ficou para trás. Deixando de dar lugar para o agora , remoendo
uma condição que não mais existe.
Penso que o mais desafiador
dessa vida é poder se movimentar no presente, não apenas em direção ao futuro ,
mas colocando o passado em seu devido lugar.
Ressignificando-o. Dando outro sentido para a
vida que tive até então, acabo colorindo –a com um tom mais vivo, assim me locomovo com mais tranquilidade em
minha história . Transito pelas minhas memórias, visito –as, como um espectador
que revê um filme e se aproxima de uma cena com um outro olhar. Este seria o
verdadeiro preparo para o que vier pela frente. Para olhar para o que virá
adiante é preciso leveza, acima de tudo. Existem bagagens que levamos que são
desnecessárias .
Nosso arsenal para a luta da vida são nossas
vivencias, aquilo que armazenamos, nossa história . E obviamente isso também
agrupa os momentos duros, tristes ; bem como , os que fui humana, imperfeita. Fui trazida até aqui também pelos o meus
momentos ridículos, bobos, inseguros, aflitos. E pela forma como os enfrentei.
Aí, nesse cantinho mora a coragem e esperança.
Esse cantinho verde, cor do trevo de quatro folhas, o lugar onde nos perdoamos e rimos de nós mesmos, com
ternura . Aceitamos resignados o nosso papel errante . E assim podemos ir
adiante .
Henri Bergson em O Riso,
coloca que nada desarma mais do que o riso. Rimos daquilo que é humano,
imperfeito.
Rir de si mesmo tem á ver com a possibilidade
de se movimentar em nossa imperfeição , de se flexibilizar frente
a imagem que gostaríamos de passar e aquilo que somos . Portanto aí mora a
possibilidade de reinvenção.
Não há nada mais insuportável
do que aqueles que não riem de si mesmos.
Nada mais persecutório do que a seriedade, aquele script a ser seguido,
rígido, em linha reta . Nada é tão reto,
tão estático quanto o eletro que mostra que a vida se encerrou. O que simboliza a vida é movimento, seus
altos e baixos
Não existe um passado feito só de coisas boas, assim como
não é possível um futuro ideal. Existe o futuro possível .
Este, não precisa ser
perfeito para ser bom . Nem a gente .
Sendo assim, o que resta é:
darmos boas vindas ás aventuras que os novo ciclos nos reservam. Feliz ano novo.
Helena Cunha Di
Ciero é psicanalista - membro filiado da sociedade de psicanálise - mãe do
Francisco e vai ser para sempre filha do Paschoal , com muito orgulho e
gratidão .
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