sábado, 27 de fevereiro de 2010

Vestígios de uma civilização azul.

Hoje se casa aquele que foi um homem tão especial para ela.Pelo menos assim ela o soube, via notícia de jornal.Quem um dia diria que eles que foram tão cúmplices, tão amantes e tão amigos se distanciariam a esse ponto.Ela estava feliz por ele e lhe desejava o melhor, de coração.Embora isso parecesse hipocrisia, era fato consumado dentro dela.
Afinal, dez anos haviam se passado e tantas coisas haviam acontecido na vida de ambos que nem adiantaria lhe desejar isso pessoalmente.
No entanto o que ela gostaria de ter feito, nunca fez.Por covardia talvez, pelo medo da indiferença dele (que lhe era usual) ou por que agora ele era um estranho.O que ela queria ter feito nesses dez anos e nunca fez, era agradecer a ele pelo quanto ele a transformou.Talvez ele nem soubesse o quanto lhe ensinou , mas ela sabia. E essa era a melhor herança que ele havia deixado com ela.E isso era dela, de mais ninguém.Nem o tempo vilão a roubaria dessa vivência.
Viriam ao certo amores mais maduros e tão intensos quanto aquele.Com ele aprendeu a ser mulher, no sentido de lutar pelo que lhe importava.A respeitar as diferenças , a valorizar o encontro entre duas pessoas. A admirar de poetas á revolucionários.
Fazia um mês mais ou menos que havia pintado a parede de seu quarto de azul Hortência , e de fato , não havia se dado conta que era a cor do antigo quarto da casa dos pais dele. Só hoje quando começou a escrever é que lembrou-se daquelas paredes que tanto acolheram os dois jovens amantes, que se descobriam um no corpo do outro cheios de curiosidade e paixão. Aquela cor lhe trazia uma coisa boa, embora ela não soubesse o que.Aquela parede agora era dela, cenário aonde ela e o marido juntos construiriam uma vida.
Então isso que ele havia virado? Uma parede? Um muro intransponível. A distancia que o tempo cria chega a ser cruel, mas necessária.Meu pai sempre disse que a paixão é uma devassa, que destrói tudo que um dia foi construído. Concordo. Afinal, depois dele uma outra cidade se criou. Como os muros de tróia uma série de descobertas seriam feitas, depois que aquele amor se desfizesse.
Pois foi ele quem a preparou para outros amores. Foi transpondo aquele muro com toda a bagagem daquela antiga civilização azul Hortência, que ela foi em busca de outras construções . Que de fato seriam para sempre. Então é isso que ela deseja secretamente a ele no dia de hoje: que ele construa uma linda cidade, um lindo império. O nome de imperador ele já tinha e a força de um deles também. E que seu horizonte fosse tão azul quanto as paredes de seu antigo quarto.
Outro dia ela folheava um livro de Drummond e achou aquele poema tarde de maio, que ele tanto gostava e que lhe ensinou a gostar.Ficou feliz por saber que ele se casaria em Maio, como no poema.Havia uma estrofe que dizia ‘COMO AQUELES PRIMITIVOS QUE CARREGAM CONSIGO O MAXILAR DE SEUS MORTOS, EU TE CARREGO COMIGO TARDE DE MAIO.”Estrofe essa que ele insistia em ler errado trocado tarde de maio por tarde demais. Os dois viviam achando que assim o poema ficaria mais bonito. Concordo.É pena que configurou-se uma profecia. Já que é tarde demais para que ela lhe deseje todas as coisas bonitas que disse acima.
Eu desejo profundamente á aqueles que amo que não deixem ser tarde demais para sentir gratidão por aqueles encontros que mudaram sua vida.
Não é necessário que isso seja dito,obviamente.Mas que seja sentido.Assim é o único jeito de agente validar algo que foi vivido. E fechar com chave de ouro um ciclo.















Tempestade...

"Tempestade
que passasse
deixando intactas as pétalas
você passou por mim
as tuas asas abertas
passou
mas sinto ainda uma dor
no ponto exato do corpo
onde tua sombra tocou
que raio de dor é essa
que quanto mais dói
mas sai sol?"

(Leminsky)

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