quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Essa tal maternidade.

Ser mãe é ser uma constante contradição . Há alguns finais de semana atrás resolvi ir sem as crianças para um casamento em Pirenópolis . Tudo certo , deixei os aqui . O lugar é famoso pelas cachoeiras e a festa prometia ser boa .Fui só com o marido ,pela primeira vez viajei sem a pequena de um ano e o mais velho já está acostumado com algumas viagens . 
Na mala: dois livros ( confesso que estava empolgada com a solidão , pretenção minha de ler dois volumes em três dias ).
No aeroporto de Congonhas , só com uma mala de mão , me sentia tão livre que até maquiagem comprei . Resultado : As dez da manhã eu já estava fantasiada em pleno aeroporto , rímel , batom , iluminador - tudo que a vendedora poderia me oferecer . 
Quando entrei no banheiro entoava mentalmente o pagode " Essa tal liberdade " , que leveza meu Deus .
Entro no banheiro e me deparo com uma mãe atrapalhada trocando a fralda de um filho , ufa que não sou eu . Olho para ela com carinho , como é difícil manter um bebê num trocador . Ela sabe que sou mãe pelo jeito que olhei para ela . Não há rímel ou delineador que disfarce essa troca de olhares . É que as mães se reconhecem pelo coração , não pelos olhos . 
Avião quase saindo passo em frente a uma loja de brinquedos . Uma Dory que repete o que a criança fala , grava e muda o tom de voz me chama . Gente que maravilhoso , meu filho vai amar , ele adora o fundo do mar . Meu marido me convence que era um trambolho, muito caro, importado . Resignada eu saio da loja , de mãos vazias , trocando um olhar cúmplice com a vendedora . Com certeza ela é mãe também . 
Um aviso que o avião atrasará :Oba , livraria ! Há quanto tempo não leio uma revista : Elle nas mãos . No caixa vejo uma bola colorida de plástico que acende . Um polvo com vários tentáculos coloridos . Só tenho 20 reais . Mas meu filho vai amar . Para quê serve mesmo revista ? Fazer pilha e amontoar na sala . Folheio com rapidez , ah tá , entendi : Cintura alta voltou . Ufa . Nada pode ser mais relevante do que isso na moda atual para uma mãe de dois . Nem precisei comprar a revista para tal constatação . 
O polvo verde limão , roxo , azul e pink vence .
Estou andando para a sala de embarque toda maquiada , com um brinquedo colorido que acende : Sou uma contradição ambulante . Batom russian red na boca e uma sacola teimosa que não para de piscar . O tal brinquedo é exibido . 
Já quase entrando no avião vejo uma loja de artigos de renda: Nossa , que lindo aquele vestido ! 
Corro em direção à loja : 
- Amor , vamos perder o avião - Diz o sábio marido . 
Pouco importa , o vestido de renda é a cara da minha filha , conto para a vendedora enquanto mostro a foto dela no celular. 
Entro no avião , finalmente . Cheia de sacolas . Até um pouco exagerada para um vôo doméstico .
Gabriel Garcia Marques ou uma soneca ? Opto por ambos , que delicia . 
Assim que pouso sou tomada por uma saudade enorme , ligo em casa , está tudo bem . Almoçaram . A pequena dorme e o mais velho me diz que vai ao cinema com o padrinho assistir o filme da Dory .
Tudo está bem . Vou dançar bastante na festa , vou conhecer cachoeiras . Mas meu coração bate de verdade dentro daquela sacola iluminada, o resto é maquiagem.

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